Bons tempos aqueles!
Nos anos oitenta, o RH da empresa tinha como meta ministrar 200 horas anuais de treinamento aos seus gerentes. Com pompa e circunstância. Entre outras mordomias, ônibus especial para transporte dos treinandos a um hotel chic, no Guarujá. Praia, muita cerveja – que ninguém é de ferro – e grandes “papos”, a noite toda. Viajava-se no domingo, à tarde, na ida, e a volta era no sábado seguinte, depois do almoço e de muita “curtição”. Provavelmente, o conteúdo do programa, não era o que mais motivava esses gerentes.
Trata-se de um caso real, mas excepcional, apresentado apenas para mostrar o contraste com o que acontece, nos dias de hoje. Naquela época, além do investimento da própria empresa, havia uma lei federal que permitia às empresas recuperarem parte das despesas realizadas com Treinamento.
Isso é passado. Nos tempos da globalização, as empresas investem no treinamento que consideram essencial. Ou seja, com aqueles programas que contribuirão para o cumprimento de suas estratégias, para o atingimento de metas do negócio ou para atender alguma necessidade imediata ligada a um novo processo ou procedimento.
Essa mudança radical ocorreu, por várias razões: a concorrência tornou-se mais acirrada, as margens de lucro diminuíram, os encargos sociais aumentaram muito, passamos por crises financeiras, a lei que incentivava despesas com Treinamento, deixou de existir. Reforçadas por todos esses inconvenientes, as empresas passaram a acreditar que os seus colaboradores deveriam fazer algo por conta própria, a favor de seu desenvolvimento.
E essa tendência veio para ficar. O que estamos vivenciando é o “cada um por si e Deus por todos”. Ou seja: foi delegado ao próprio colaborador, o cuidado com seu plano de carreira e com sua preparação para chegar onde planeja, por seu próprio esforço, bancando as despesas. Isso se chama autodesevolvimento.
Em outros termos, autodesenvolver-se significa buscar conhecimento e experiência que possibilitem melhorar o desempenho no cargo atual ou que prepare o profissional para galgar um cargo mais importante, no futuro. Por trás da simplicidade da definição, existe a complexidade do que deverá se seguir. Nada mais do que refletir e responder as seguintes perguntas:
- Onde quero chegar?
- Quais são meus pontos fracos e fortes?
- O que devo aprender? Em quanto tempo?
- Onde vou buscar esses conhecimentos?
- Tenho recursos (tempo e dinheiro) para isso?
Como dissemos, pode parecer que se trata de um exercício simples. Mas, não é. A meta deve ser clara e o percurso bem definido, considerando os próximos dois ou quatro anos. Você pretende ficar na mesma empresa ou conhecer outra cultura? Permanecer na mesma profissão ou abraçar outra? Deseja um cargo acima ou apenas melhorar a remuneração? Aprender mais ou já aprendeu tudo o que devia?
As respostas aos cinco itens mencionados devem ter, pelo menos, duas naturezas diferentes: a primeira, está relacionada a conhecimentos técnicos, ou seja, ao ferramental que você deverá dominar para que os processos que estarão sob sua responsabilidade sejam executados, adequadamente, e os objetivos sejam alcançados. A segunda, está relacionada às características pessoais. Este item é ainda mais complexo e começa pela imagem que você transmite ao apresentar-se. Empatia e estrutura pessoal para relacionar-se, apropriadamente, ou supervisionar outras pessoas.
Um complicador do autodesenvolvimento é a obtenção de referências, detalhes sobre esses itens. Se for o caso, deve-se buscar ajuda de um amigo, da área de RH da empresa, de um consultor especializado ou do próprio chefe, se houver ambiente para isso, e submeter-se a testes especializados. É provável que o seu empregador disponha de um processo de avaliação de desempenho e esta é uma ótima fonte de informação, pelo menos para os pontos que você deve melhorar, no cargo atual.
Outro complicador é a disposição de munir-se de disciplina para colocar o plano em ação. E a primeira preocupação será a de administrar o tempo, de forma diferente, abrindo mão de horas de sono, ócio e baladas, estudar com afinco, fazer cursos, visitar empresas e falar com pessoas mais experientes, entre outras.
Há mais um detalhe importante para aqueles com mais de quarenta anos. Na fase áurea do treinamento, a gestão de pessoas valorizava a pontualidade, a disciplina, a ordem e a economia. E os programas de treinamento versavam sobre planejamento, organização, controle, comando e coordenação. Hoje, tudo isso faz parte de modelos mentais antigos. Os assuntos atuais versam sobre estratégia, negócios, resultados, mudança, inovação, competitividade e criação de valor.
Por outro lado, com mudanças tão rápidas quanto às que temos assistido, está cada vez mais fácil ser incluído na categoria dos “dinossauros”. E, cada vez mais, as empresas buscam “talentos”, pessoas atualizadas, com iniciativa, empreendedores, criativos, que “vistam a camisa” e que amem o trabalho. De preferência, prontos, que não requeiram tempo e despesas com treinamento.
Meu conselho: sonhe sonhos possíveis. Não queira dar passos maiores do que as pernas. Com objetivo bem definido e persistência, você chegará lá.